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domingo, 21 de dezembro de 2014

Preparador de goleiros limeirense Marquinhos Domingues enfrenta o medo para ter sucesso no Iraque


O dia do preparador de goleiros limeirense Marquinhos Domingues em Bagdá, capital do Iraque, se divide em muito trabalho no Al Shorta, uma espécie de Corinthians de lá pelo fanatismo de sua torcida, e o medo constante dos atentados com bomba.

Há um ano e meio no país mais problemático do mundo, que vive cercado por conflitos, Marquinhos pensa positivamente e entrega o futuro nas mãos de Deus. "Tenho que focar somente no meu trabalho. Se a todo o momento eu pensar em bombas e mortes, não conseguirei desenvolvê-lo da melhor forma possível. O Iraque não tem coisas só ruins. Vivo bem em Bagdá, mas é claro que quando se fala nessa cidade todos se assustam, e não é por menos. Espero cumprir meu contrato até o fim e quem sabe, renová-lo por mais dois anos", comentou.

Domingues foi indicado ao Al Shorta pelo empresário brasileiro André Costa. Seu primeiro contrato foi de apenas um ano. Mas o sucesso foi imediato. Com uma filosofia diferente e com vários tipos de treinamentos para goleiros, Marquinhos ganhou a confiança dos jogadores, dos demais integrantes da comissão técnica e principalmente do presidente do time.

O destino fez com que logo em seu primeiro ano naquele país, o Al Shorta conquistasse o Campeonato Iraquiano. Após 24 rodadas e no sistema de pontos corridos, sua equipe terminou em primeiro lugar, apenas um ponto à frente do Arbil. "Foi emocionante. Ganhar esse título, foi a afirmação que meu trabalho e de toda a equipe foi bem feito. Tinha certeza de que após esta conquista eu permaneceria no país", frisou.

E não deu outra. Apoiado pelo capitão da equipe Nachar Akran, que inclusive jogou com Elano no Manchester City da Inglaterra, Marquinhos renovou seu contrato por mais dois anos.

Mohameed Gassed, Shaif, e Hammed Hamid
O limeirense treina simplesmente os dois goleiros mais importantes do Iraque. Gassed é o mais experiente. Foi campeão da Copa da Ásia de seleções em 2007, sob o comando do brasileiro Jorvan Vieira. Hamid, mais novo e melhor, vive um momento espetacular no gol da seleção iraquiana. "O que mais me deixa feliz é que os dois têm confiança em meu trabalho. Respeitam-me e fazem exatamente tudo o que peço nos treinamentos", afirmou.

Invicto e rumo ao bi

E o Al Shorta está no caminho certo para conquistar o bi. Após quatro rodadas, a equipe soma 10 pontos, graças a três vitórias e um empate. O campeonato será retomado no começo do ano e sua equipe tem quatro jogos a menos que os rivais.

Outro objetivo da equipe do limeirense é conseguir um bom resultado na Copa da Ásia de Clubes, uma espécie de Libertadores na América. No ano passado seu time foi eliminado no qualifying por 1 a 0, com um gol no fim. Desta vez, segundo ele, o Al Shorta está mais preparado e motivado pela conquista do Campeonato Iraquiano.



"Como a Fifa nos impede de jogar em Bagdá, em nosso estádio, mandamos nossos jogos no Catar. Será um quadrangular e nosso principal adversário será o Al Jazira", lembrou. O técnico do time é o egípcio Mohamed Youssef, ex-zagueiro da seleção de seu país. "Ele é rígido e mantém as decisões que toma. É disciplinador e conhece muito futebol. Temos uma excelente parceria na comissão técnica", reforçou.

Domingues está em alta no país e chegou a ser cotado para trabalhar na seleção iraquiana de futebol, através de uma indicação do goleiro Gassed. "Foi por pouco. Meu nome era comentado a todo o momento. Quem sabe um dia eu realize esse sonho. Será o ponto alto da minha carreira", salientou.

Currículo

Marquinhos Domingues foi goleiro do Independente de 1988 a 1990. Era reserva de Ivan e depois de Serginho. Uma lesão grave na tíbia e no perônio fez com que a carreira do arqueiro fosse interrompida.
Mas o futebol corria pelas veias do limeirense, que começou a trabalhar como preparador de goleiros no XV de Piracicaba em 2000, com Amarildo.

Na Inter de Limeira trabalhou de 2002 a 2006, conquistando o Campeonato Paulista Sub-20 de 2003 e a Série A-2 de 2004, com seu fiel escudeiro Carlos Carioca.

Passou por Brusque/SC, União São João por três temporadas e Gyongnan da Coreia do Sul. Sob o comando de Zico e do técnico limeirense Gilson Granzotto excursionou por Alemanha e Dubai (essa última com o limeirense André Zaros) para uma série de amistosos.

Voltou ao Brasil onde trabalhou na Itapirense com o técnico Velloso, no Grêmio Maringá com Play Freitas, no Central de Caruaru com o ex-volante Alemão (Napoli) e por último no Marília, quando subiu para a Série A-2 com Luís dos Reis.

Férias em Limeira

Marquinhos Domingues, de 45 anos (19/10/1969), passará as festas de fim de ano em Limeira, ao lado da esposa Simone Fonseca, com quem está casado há 16 anos. O preparador também matará a saudade da filha Júlia, de 16 anos, que reside em Rio Claro. O profissional é filho de Manoel Domingues e de dona Mercedes Domingues.

Domingues estava próximo de atentado que matou 30 pessoas

Dificilmente Marquinhos Domingues esquecerá do dia 17 de outubro deste ano. Uma bomba explodiu no centro de Bagdá, atingindo um hotel e deixando mais de 30 mortos. Exatamente a dois dias do seu aniversário.


O limeirense estava aproximadamente a um quarteirão do local e ouviu tudo. "Foi o dia em que mais senti medo em minha vida. Estava descansando no hotel em que moro, no terceiro andar, quando por volta das 22h ouvi um grande estouro. Achei no primeiro momento que eram os geradores do meu hotel. Desci rapidamente para a saguão, quando me deparei com muita fumaça e todos os vidros quebrados, além da gritaria. A explosão foi tão forte que danificou toda a fachada do meu prédio. Em casos assim, os terroristas adicionam pregos e metais nos explosivos C4, para causar mais danos e atingir o maior número de pessoas possíveis. Fui aconselhado pelos policiais a me dirigir para o esconderijo subterrâneo do hotel, pois nesses casos uma nova bomba é acionada logo em seguida. Foram momentos de muita tensão. Não conhecia nenhum dos mortos", contou.

Marquinhos Domingues tem a companhia de outros dois brasileiros, o massoterapeuta Tonello, ex-Marília e o preparador físico Anderson Nicolau, de 32 anos, ex-Ipatinga. "Vi que meus amigos estavam com muito medo. O Anderson começou a arrumar as malas para retornar ao Brasil. Conversei demoradamente com ele e o convenci a permanecer, até para cumprir o seu contrato. Mas confesso que não foi fácil. Você acaba se assustando até quando uma porta bate mais forte, por exemplo", explicou.

Domingues contou que evita ao máximo sair à noite, mas lembrou que os atentados geralmente acontecem entre 11h e 17h, os chamados horários de pico, quando as pessoas ficam mais aglomeradas. "Os terroristas visam restaurantes e feiras. A gente tem medo, por exemplo, quando um carro estaciona. Você logo imagina que ele está cheio de explosivo", disse.

Marquinhos mora exatamente no centro de Bagdá, em uma das avenidas mais famosas e movimentadas da capital. Mesmo reforçada de segurança, dificilmente os atentados são evitados. Exatamente, por isso, o limeirense não leva sua família para o Iraque. "Eles não teriam vida social lá. Não acho que seria vantajoso para eles. Igual ao Brasil não há", destacou.

O preparador de goleiros disse que evita pegar até táxi. "Geralmente os atentados envolvem esses veículos. Nosso time é da Polícia e desta forma, os jogadores e membros da comissão técnica são sempre vigiados e protegidos. Isso nos dá uma segurança maior. Temos a ajuda também do nosso tradutor, que é iraquiano, porém, ele morou 13 anos no Brasil. O Ali é o nosso braço direito", contou.

Marquinhos disse que nesse período do ano a violência diminui no país, porém, a segurança segue reforçada. "Temos check point a cada 600 metros. O comando para todos os veículos e o detector de metal é passado. Qualquer sinal de bomba e o carro é isolado. Isso ajudou a reduzir o número de ataques", frisou.
Domingues lembrou que a guerra acabou e que o Iraque está passando por um período de reformulação. Lembrou que os principais terroristas residem no Curdistão, cidade próxima de Bagdá. 

Nesse tempo em que cumpre seu contrato no Iraque, Domingues teve a oportunidade de conhecer vários países como Turquia, Líbano, Catar, Dubai, Kuwait, Egito e Bahrein.


Homenagem da torcida na morte de seu irmão

E o amor pelo Al Shorta e por sua torcida aumentou em maio deste ano. Um dia antes de uma partida importante pelo Campeonato Iraquiano, Marquinhos foi informado do falecimento de seu irmão Valdecir Aparecido Domingues, de 50 anos, vítima de um câncer na medula óssea.

O preparador de goleiros foi liberado pela diretoria para participar do velório, mas a viagem de volta ao Brasil demoraria quase dois dias. "Decidi permanecer em Bagdá. Foi o momento mais difícil da minha vida. Na concentração do time todos os jogadores e diretores vinham me confortar. Senti um imenso carinho de todos", lembrou.

Mas o reconhecimento pelo trabalho do limeirense foi mais além. No dia do jogo, Marquinhos Domingues entrou em campo para aquecer os goleiros, quando viu uma imensa faixa na arquibancada. Nela estava escrito, em português: "Coach Marquinhos, o povo iraquiano e a torcida do Al Shorta estão com você nesse momento de dor". Domingues disse que chorou copiosamente. "Foi difícil trabalhar naquele dia", frisou.

E para completar, a partida estava empatada por 1 a 1, quando o treinador chamou o reserva Mustafá Karin para entrar no jogo. O jogador foi até o preparador de goleiros limeirense, o abraçou e disse que marcaria o gol da vitória para homenageá-lo. "Ele cumpriu a promessa. Fez o gol e todos foram ao meu encontro para comemorar. Foi difícil conter a emoção naquele inesquecível 19 de maio. É por isso que pretendo ficar o maior tempo possível no país e principalmente nesta equipe que passei a amar muito", completou.

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